266. Aquele Que Está Estabelecido Entre Nós
28 de Março de 1962
O Rabino Hiyya disse: “Aquele que está estabelecido entre nós tem o conhecimento de setenta anciãos. O vinho foi dado em setenta letras, e um segredo foi dado em setenta letras; quando o vinho entra, sai um segredo sai” (Iruvin 65). RASHI interpretou “estabelecido entre nós”, que “Bebe vinho, mas o seu intelecto não fica perturbado”. Um segredo existe, pois aquele cujo segredo não saiu é equiparável a um Sinédrio de setenta.
Devemos perguntar:
1) Segundo isto, aquele que quer ser equiparável ao Sinédrio não precisa de se esforçar na Torá e no trabalho, e tem o caminho simples de beber vinho enquanto vê que o seu intelecto permanece límpido.
2) Qual é a resposta de que o seu “segredo não saiu”? Obtém-se a mesma plenitude que o Sinédrio por não deixar sair o seu segredo? E se ele deixou sair o seu segredo? Aquele que deixa sair o seu segredo comete uma transgressão tão grave que se possa dizer que por isso perde o seu valor, que já não é considerado como os setenta do Sinédrio? E se ele se mantém sem deixar sair, tem o mesmo valor que o Sinédrio?
Devemos compreender que, em ética, o caminho da Torá é que se acredite no Criador sem qualquer conhecimento ou realização espiritual, mas apenas acima da realização espiritual e da razão. Então, quando se ocupa da Torá e das Mitzvot [mandamentos], é considerado um judeu. Pelo contrário, aquele que quer ser um servo do Criador apenas numa maneira de conhecimento e realização, isso é considerado idolatria (como explicado no Sulam [comentário Escada sobre o Zohar] em vários lugares).
Mesmo quando ele é posteriormente recompensado com realização e conhecimento, não deve usar isso como suporte para o trabalho, ou seja, dizer que agora está feliz por ter realização espiritual, que se libertou do fardo da fé, que tinha o trabalho de ir acima da razão, que é um grande esforço e agora está feliz por não precisar de se esforçar pela fé e está livre de carregar esse fardo chamado “como um boi ao jugo e como um burro à carga”.
Pelo contrário, ele deve compreender que, ao ser recompensado com realização espiritual, agora está feliz por ver que o caminho que seguia antes, o caminho da fé, que é a visão da Torá, é o caminho verdadeiro. E a prova é que agora ele foi recompensado com a aproximação ao Criador, que o Criador lhe deu a realização espiritual.
Portanto, agora ele recebe força da realização espiritual para que possa continuar a caminhar no caminho da fé. Por conseguinte a realização é um apoio para a fé de maneira que ele continue a caminhar no caminho da fé.
Não é assim. Pelo contrário, se ele usa a fé como apoio para a realização espiritual, ou seja, que a fé é um meio para ser recompensado com realização espiritual, então quando alcança o objetivo, descarta o meio. Portanto, ele expulsa a fé e assume para si o caminho de ir apenas onde tem realização. Esta não é a visão judaica.
Como Baal HaSulam interpretou, há a questão dos pastores do gado de Abraão e dos pastores do gado de Lot. Os pastores do gado de Abraão são chamados “posses de Abraão”. Esta é a qualidade da fé, pois Abraão é chamado “o pai da fé”.
“Pastores” significa nutrições, o que significa que a realização espiritual e a razão que ele recebe são para fortalecer a fé, que a realização espiritual é prova de que devemos caminhar nos caminhos acima mencionados, ou seja, ele usa isso como prova. Portanto, quando caminhamos no caminho da fé, o Criador aproxima-o e dá-lhe a luz da Torá.
Não é assim com os pastores do gado de Lot. “Lot” significa uma maldição, da palavra Latia [aramaico: amaldiçoado]. Isso significa que aquele que recebe realização espiritual para poder servir o Criador dentro da razão, disso estende-se uma maldição, ou seja, a luz da Torá afasta-se dele e ele permanece nu e desamparado.
A razão pela qual devemos caminhar nos caminhos da fé é que há a questão da recepção no intelecto e no coração, e a recepção no intelecto é chamada “saber”, até aqui a essência das suas palavras.
Com tudo o que foi dito acima, podemos interpretar as palavras do Rabino Hiyya: “Aquele que está estabelecido entre nós”. “Vinho” significa o vinho da Torá, como está escrito no Zohar, ou seja, a luz da Torá, que é considerada como lhe sendo mostrado os segredos da Torá. Isso é considerado realização espiritual e conhecimento.
“Aquele que está estabelecido entre nós” significa que, ao receber a luz da Torá, o seu intelecto não se perturba, ou seja, a razão que ele tinha antes de receber o vinho da Torá não se perde, ou seja, não desaparece dele. Pelo contrário, a razão que ele tinha antes torna-se estabelecida dentro dele.
Ao obter o vinho da Torá, o seu intelecto torna-se estabelecido. Isso requer caminhar nos caminhos da fé, que ele tirou daqui uma prova de que o caminho da fé é o caminho verdadeiro, e a prova disso é que o Criador o aproximou e lhe deu a luz da Torá. Conclui-se que através da luz da Torá, o intelecto que ele tinha antes de ser recompensado com o vinho torna-se estabelecido dentro dele.
Este é o significado de “Quando o vinho entra, um segredo sai”. Um segredo é chamado “fé”, pois algo em que não há realização espiritual ou razão é considerado um segredo. Portanto, quando o vinho, que é a realização espiritual, entra, um segredo sai, pois a Torá é considerada como revelação, que é o oposto do segredo.
Por esta razão, aquele que foi recompensado com a luz da Torá e não deixa sair um segredo, ou seja, a fé que tinha antes não sai dele e ele continua a caminhar de maneira secreta, é equiparável aos setenta do Sinédrio. Pela qualidade da fé que cresce nele, ele torna-se semelhante ao Sinédrio.
Embora fossem considerados “os olhos da congregação”, pois foram recompensados com a sabedoria da Torá, ainda assim mantinham-se na qualidade da fé. Portanto, a pessoa que foi recompensada com o vinho da Torá e não deixa sair o segredo, e permanece com a sua visão de continuar a caminhar de maneira secreta, embora agora tenha revelação e realização espiritual, é como os setenta do Sinédrio.
Este é o significado de “O vinho foi dado em setenta letras, e um segredo foi dado em setenta; quando o vinho entra, um segredo sai”, pois em cada coisa há Panim [face/anterior] e Achoraim [costas/posterior], que são considerados como luz e Kli [vaso]. Ou seja, a qualidade completa da luz deve estar implícita no Kli, pois o Kli é o instrumento que será capaz de atrair a luz dentro dele.
É por isso que é chamado “setenta”, como em “setenta faces da Torá”, o que significa que, quando ele trabalha de maneira “secreta”, que é a fé, deve imaginar e retratar para si próprio que servirá o Criador com o mesmo vigor como se tivesse sido recompensado com o vinho da Torá, chamado “setenta faces da Torá”. “Olho” implica saber, e ver com o intelecto é chamado “os olhos da congregação”, referindo-se aos sábios da congregação.
Quando ele se mantém desta maneira, mesmo quando tem um lugar para receber visão e realização espiritual, é equiparável ao Sinédrio.
Isto é semelhante a alguém que acredita no Criador, que Ele ouve a oração, embora todos os dias, quando ora e não vê que o Criador ouve a oração, ainda assim acredita que o Criador ouve a oração. Mas quando é recompensado com o Criador respondendo a todos os seus pedidos, ele já não precisa de acreditar que o Criador ouve uma oração, pois vê com os seus próprios olhos que o Criador lhe está a dar o que ele quer.
Portanto, o lugar onde ele deve acreditar é chamado “um segredo”, e o lugar da revelação é chamado “o vinho da Torá”. O homem deve fortalecer-se na fé mesmo num lugar onde pode receber a revelação de que o Criador ouve uma oração.