Justos e Ímpios
(De manuscritos de Baal HaSulam que nunca foram publicados)
Quando uma pessoa se purifica para aderir ao Criador, torna-se inteiramente doação e já não tem em si nada do desejo de receber. Assim, como poderá receber a Sua abundância, com a qual Ele desejou deleitar as Suas criaturas? Por esta razão, o Criador imprimiu em cada pessoa que ela vai incluir em si todas as pessoas do mundo. Ou seja, as opiniões e naturezas de todas as pessoas do mundo vãom reinar e unir-se em cada pessoa do mundo, uma vez que os pensamentos e as visões das pessoas passam de uns para os outros.
Assim, quando uma pessoa se purifica e se torna um justo completo, continua, ainda assim, ligado aos ímpios de todo o mundo, os quais lhe transmitem, contra a sua vontade e sem intenção, o seu desejo de receber. Por esta razão, o justo está pronto para despertar com um desejo e receber o Seu deleite, que é o propósito dos céus e da terra.
Deste modo, este justo contém verdadeiramente centelhas das almas dos ímpios e dos justos de todo o mundo, tanto do passado como do futuro. Depois de corrigir as almas dos justos com as quais está incluído e de aderir devidamente através delas em doação, as almas dos ímpios nele incluídas começam a abrir as suas bocas para receber prazeres. Nessa altura, a pessoa torna-se um Kli [Vaso] para receber o Seu deleite, e alcança o seu propósito, pois tem um desejo de doação, que causa Dvekut [adesão] por equivalência de forma, e tem um desejo de receber através das almas dos ímpios incluídas em si. Isso torna-o num Kli [Vaso] para receber o Seu deleite e abundância.
Então, as almas dos justos invejam as ações dos ímpios, pois veem que o desejo do Criador, de deleitar as Suas criaturas, se concretiza principalmente através das ações dos ímpios, pois as ações dos justos apenas causam Dvekut, que é o desejo do inferior, mas as ações dos ímpios causam a realização da vontade do Criador, ou seja, deleitar as Suas criaturas.
Contudo, na verdade, as almas dos ímpios não estão aptas para conter a abundância que recebem, pois apenas se conectaram aos justos para despertar neles o desejo de receber o Seu deleite. Já os justos, que já foram recompensados com Dvekut e com o desejo de doação, agora ganham duas vezes: têm Dvekut e também recebem o Seu deleite para a doação, o que é essencialmente o desejado. Ele disse que os justos se completam inteiramente através dos ímpios, e então todas as almas dos ímpios são removidas do nível dos justos, pois os ímpios apenas conseguem receber para si próprios e não para doar, como fazem os justos.
Providência Particular e Orientação de Recompensa e Castigo
O caminho do sofrimento é a providência particular, e o caminho da Torá é a orientação da recompensa e do castigo. Isto explica as questões do conhecimento e da escolha, pois, de facto, toda criatura deve pecar, como está escrito: "Não há justo na terra que não peque" (Eclesiastes 7:20), e toda criatura deve arrepender-se, como está escrito: "Nenhum desterrado será desterrado d’Ele" (2 Samuel 14:14), e também "A terra estará cheia do conhecimento do Senhor" (Isaías 11:9). No entanto, esta necessidade torna-se clara através das rédeas da natureza do prazer físico e do sofrimento, que conduzem a pessoa para onde a Providência deseja, conforme está escrito no ensaio "A Essência da Religião e o Seu Propósito".
Todavia, há também o caminho da Torá, para aqueles que estão mais próximos e mais aptos ao desenvolvimento, como está escrito: "Ele viu que os justos eram poucos; levantou-Se e plantou-os em cada geração" (Yoma 38b). E também: "Não há geração sem alguém semelhante a Abraão, Isaac e Jacob" (Midrash Rabá, Bereshit 56:9). Estes podem transmitir da sua sabedoria às massas, que ainda não estão desenvolvidas, e esta transmissão é chamada "o caminho da Torá" [Nota do autor: referindo-se à Torá Oral, pois a Torá Escrita é também Torá Oral, já que quem ensina ABC pode também ensinar XYZ]. Por isso, as massas que aceitam o caminho dos justos tornam-se aptas para alcançar a sua completude na sua própria geração, embora, de acordo com a ordem da providência particular, ainda tivessem de reencarnar durante mais cem gerações antes de aceitarem a lei do seu desenvolvimento através da natureza. Todo esse tempo e sofrimento são considerados para elas como uma grande recompensa, caso sigam as palavras do seu professor, ou como severos castigos, caso não as sigam. Isto é o significado de "O corte e a morte estão nas mãos do céu", ou seja, caem novamente nas mãos da natureza devido à transgressão.
Este é o significado de Teshuva [arrependimento/regresso], que consiste em voltar a ligar-se ao caminho da Torá. (Isto é também o significado do Inferno e do Jardim do Éden, que se referem à purificação da alma que ocorre no período entre um corpo e outra encarnação. Durante esse tempo, ela adquire uma certa correção, até que todas as matérias e forças, boas ou más, que ela realizou na primeira encarnação, sejam vinculadas a ela. Este é o significado da receção, mas não o explicaremos aqui).